Ao acordar após o trágico 8 de janeiro de 2023, todas as pessoas comprometidas com a democracia e a legalidade no Brasil vivenciam o desafio de elaborar respostas ao horror do extremismo violento. Aponta-se a influência, ou até mesmo participação, na ação violenta, de atores internos às próprias estruturas estatais – seja em postos de liderança de governo ou de representação política, seja nas forças de segurança pública e nas forças armadas – mas também possível ampliação e consolidação do extremismo de direita para além da influência de suas lideranças. Há boas propostas de compreensão da infraestrutura tecnológica que permite ou incentiva a radicalização e dos atores que, potencializando as dificuldades históricas de consolidação democrática no Brasil, promovem o extremismo de direita.
Mas há um ponto ainda a ser desdobrado pelas análises. À primeira vista, a forma mais fácil de tentar compreender o extremismo no interior das democracias constitucionais contemporâneas é encará-lo como uma mobilização de patologias individuais e irracionalidades. Além disso, a ação ostensivamente violenta pode levar as análises a ocultar o lado mais insidioso da relação que extremistas estabelecem com a legalidade e a democracia.
É necessário adicionar complexidade a esse quadro, revelando de que maneiras as pessoas assim mobilizadas atribuem sentido e legitimidade às suas ações. Há uma linguagem própria em jogo: o extremismo contemporâneo não se vale apenas de códigos frontalmente opostos ao código do direito, mas também de um que deseja hackeá-lo.