No dia 30 de maio de 2023, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei n. 490/07. O texto final, encaminhado ao Senado, define que as “terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas brasileiros” são aquelas que, em 05 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, já eram habitadas ou utilizadas pelos povos originários. Sua votação foi articulada por parlamentares ligados à bancada ruralista como forma de se antecipar ao julgamento do RE (Recurso Extraordinário) 1.017.365 pelo STF (Supremo Tribunal Federal) , que também trata do mesmo tema e teve sua repercussão geral – quando um caso tem grande relevância social, política ou econômica e a decisão vale para demais casos similares – reconhecida em 2019.
A aprovação do projeto de lei pelo Congresso e a votação no STF são os novos capítulos da disputa em relação à existência de um marco temporal para demarcação das TI (terras indígenas), que têm se desenrolado também nas esferas do poder formal e coloca, de um lado, entidades e atores vinculadas ao agronegócio e, de outro, os povos indígenas e organizações indigenistas.
Neste texto, exploramos alguns dos argumentos que embasam a defesa da tese do marco temporal, a partir da análise das manifestações de amicus curiae (amigos da corte) de associações vinculadas ao agronegócio e sindicatos rurais no caso em discussão no STF. Os achados integram pesquisa desenvolvida pelo LAUT (Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo) sobre os usos da linguagem jurídica por atores conservadores e reacionários em disputas nos campos da segurança pública, rural-ambiental e moral-religioso.
De acordo com Caio Pompeia, pesquisador do campo do agronegócio e suas conjunções políticas, o tema do marco temporal ganhou tração como alvo da mobilização do setor a partir dos anos 2010. Foi naquela época, em 2009, que a tese do marco temporal foi formulada durante o julgamento do caso Raposa Serra do Sol no STF.