Da biopolítica à necrogoverna- mentalidade

Entenda conceitos centrais para se a pensar relação do Estado moderno com política, poder, controle e os usos simbólicos da morte

Da biopolítica à necrogoverna-                   mentalidade

Biopolítica

Ideia concebida pelo filósofo Michel Foucault, inicialmente no seu curso ‘Em Defesa da Sociedade (1976)’, para designar uma técnica de poder na Modernidade. Da Idade Média ao século XVIII, as punições físicas eram o meio de expressão do poder soberano da Igreja e dos Reis. Nessa lógica, a morte era o termo final de uma escala de dor e sofrimento calculada, imposta aos indivíduos pelo poder soberano em rituais públicos. No século XIX, a noção de soberania transitou do poder do soberano às instituições de controle e suas técnicas, e pressões do corpo social para que a soberania protegesse a vida constituiu um fator decisivo para a transformação do estatuto político da morte. Assim, surge o biopoder, no qual o poder se materializa não mais por meio de demonstrações públicas de castigo e morte, mas por dispositivos de controle ou disciplina do corpo, concebendo-o enquanto máquina ou objeto. Neste contexto, trabalho e cárcere são exemplos da noção moderna de biopoder.

Racismo

Na teoria biopolítica de Foucault, o racismo é o mecanismo fundamental do biopoder. Como uma tecnologia de poder, o racismo opera de duas formas principais: forja subespécies humanas, as organizando em hierarquias; e estabelece a guerra biológica, produzindo a noção de raças anormais, nocivas ou patológicas como inimigos a serem combatidos. Assim, atua mantendo o poder preservando a saúde, segurança e vida do grupo hierarquicamente superior. A guerra biológica abrange, não só o combate a raças forjadas inferiores, mas uma variedade de poder e conhecimento articulados que afetam a vida e processos vitais, quer dos indivíduos, quer do corpo social. Nesse contexto, a criminalidade, a loucura, a sexualidade, entre outros, tidos como desvios, são alvos da guerra conduzida pelo Estado racista.

Tanatopolítica

Na biopolítica, o poder se legitima à medida que é capaz de dar condições de viver com saúde, segurança e liberdade. Contudo, a morte continua interessando ao poder, ainda que instrumentalizada por outras vias. A tanatopolítica é o anverso da biopolítica, pois transforma a morte em uma ferramenta do poder que busca assegurar a vida de um novo corpo, não mais do soberano, mas o da população. Assim, a morte é incorporada no biopoder devido à manifestação do racismo como uma demanda biopolítica. Após os escritos de Foucault, o filósofo Giorgio Agamben aprofunda os desdobramentos do conceito de tanatopolítica na sua obra ‘Homo sacer: o poder soberano e a vida nua (1995)’. O autor discute o aparente paradoxo que permite a coexistência de um biopoder centrado na maximização da vida, e a disseminação da morte em larga escala, por meio de máquinas de destruição que provocam invasões, instaurando ditaduras, massacres, guerras, genocídios, etc.

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