Tudo indica que, na última década, o Brasil ressuscitou a estupidez de outrora. Sendo assim, em revide simétrico, Paulo Roberto Pires decidiu reavivar a inteligência sarcástica que fez oposição loquaz — e incômoda — a essa mesma estupidez. Por isso, nas coxias de sua prosa indignada sussurram figuras de fundo como Millôr Fernandes e Sergio Porto. Millôr lhe fornece também a epígrafe cáustica, prenúncio do que encontraremos neste livro, reunindo quatro anos de sua produção para as revistas Época e Quatro Cinco Um.
Isso, porém, não basta para resumir o trabalho de Paulo Roberto. Embora receba o mesmo santo incrédulo que organiza, por exemplo, o “Febeapá” de Stanislau Ponte Preta, seu alvo é outro. O que busca, sobretudo, é interpelar o sujeito letrado que se calou ou, pior, fez coro “diante do fascismo” emerso. E para fazê-lo ele junta à ironia depurada de seus guias a substância teórica e o ímpeto analítico dos círculos universitários, o que é muito original e bem-vindo.
Seu projeto intelectual e político, nessa obra, consiste em mobilizar — no combate ao cinismo e à selvageria vigentes — dois polos que raramente se sentam juntos e, se por acaso o fazem, entreolham-se com grande reserva: de um lado, a tradição teórica acadêmica; de outro, a crônica argumentativa feita no calor da hora.