Grandes acontecimentos costumam impor uma urgência explicativa: buscamos entender o que está acontecendo enquanto acontece. A prudência pede uma análise inicial mais descritiva, deixando conclusões mais apuradas para o futuro. Na política, tal prudência se faz ainda mais necessária. No caso da Lava Jato, que desde 2014 influencia a política brasileira, ela costuma ser confundida com apoio. Ainda ativa, a operação — um dos elementos da crise que teve seu ápice com a eleição de Bolsonaro, em 2018 — é tema dos artigos de Corrupção e o escândalo da Lava Jato na América Latina.
Publicada originalmente nos Estados Unidos, a coletânea explica ao público estrangeiro o que é a Lava Jato e quais as suas consequências na América Latina e faz propostas para o futuro do combate à corrupção. Entre a publicação, em julho de 2020, e a tradução para o português, um ano depois, o ex-juiz Sergio Moro saiu do governo Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal decidiu que ele não tinha competência para julgar os processos contra o ex-presidente Lula, que foram anulados. Esses acontecimentos reforçaram a visão de que os operadores da Lava Jato a usavam para responder a vontades políticas próprias. A operação e seus artífices passaram de heróis a vilões.
Se essas controvérsias não existissem e não estivéssemos vivendo uma crise econômica, política e sanitária agravada pelas irresponsabilidades do governo federal, seria mais fácil lidar com os legados da Lava Jato. Discutiríamos mais a sério por que grandes empresas brasileiras optavam por pagar propina para não se submeter a processos licitatórios regulares, tema do artigo de Connor Wahrman, ou mesmo por que ainda temos um sistema de pesos e contrapesos pouco coordenado quando se trata de investigações anticorrupção, questão sobre a qual se debruça Ana Luiza Aranha.