“Se a história não dá conta de responder pelos dados [de violência] do presente, denuncia, porém, padrões de continuidade. E, a despeito de a violência epidêmica praticada no país não ser um problema recente, ela também não pode ser explicada com base numa única circunstância”. Com essas palavras a antropóloga e historiadora Lilia Schwarcz aponta uma linha mestra da história do país: a violência. Perpetuada por diversas práticas institucionais e sociais, ela foi empregada de maneira estratégica em projetos políticos passados e serviu de justificativa para o restabelecimento de uma suposta ordem política, social ou econômica. Fundações escravocratas brutais, repressão sumária a revoltas populares, silenciamento político de opositores e polícias com funções exacerbadas são apenas alguns exemplos que marcam nossa história. A despeito disso, é comum a narrativa mítica de que o país não teve conflitos candentes no decorrer dos séculos e de que haveria uma convivência harmônica entre as diversas classes sociais e as minorias étnicas.
As sete Constituições brasileiras são capazes de revelar, em parte, o erro desse mito. Elas incorporam o potencial mobilizador do imperativo da “ordem” perante a “violência” – e já esboçam como ele podia aprofundar as alegadas “violências” que pretendia extirpar, o que viria a ser confirmado por acontecimentos posteriores. As previsões nesse sentido não vieram desacompanhadas de “compromissos” complexos e frágeis, encampando demandas conservadoras e autoritárias em malabarismos com outras liberais.
Se fomos os primeiros no mundo a explicitar no corpo constitucional – em 1824 – uma declaração de direitos, o que revelaria uma originalidade sem igual, também incluímos nas Constituições, desde o início, expedientes para debelar “instabilidades” derivadas da prática desses mesmos direitos assegurados. O exercício deles, assim, revelou contradições patentes com previsões repressivas, escancarando uma acomodação incômoda de valores e princípios divergentes. Não só direitos cidadãos, mas também garantias de autonomia dos poderes constituídos e dos entes federativos foram constantemente postos à prova por previsões centralizadoras do Poder Executivo.
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